sábado, abril 23, 2011

O comunista Louçã

Imagem do lançamento do livro na FNAC, retirada daqui.

Francisco Louçã escreveu um livro recentemente e que foi lançado na FNAC: “Portugal agrilhoado”, com subtítulo “A economia cruel na era do FMI”, editado pela Bertrand. Poucos lhe deram atenção e está nas prateleiras das livrarias como mais um lançamento de ocasião. Mas não é. É um livro que repristina as teses da verdadeira esquerda que temos em Portugal: a que acredita na luta de classes e portanto no comunismo.

Louçã passa mais de cinquenta páginas do livro que tem duzentas e se lê de um trago porque em letra corpo 14 e com margens de badana, a repenicar uma tese que peregrinou directamente da teoria marxista: na desigualdade entre o “trabalho” e o “capital”, o sacrifício impõe-se sempre ao primeiro e até são os economistas que o recomendam. Sendo certo que é o segundo que tem levado sempre vantagem competitiva.

Para tal “ o fisco protege os rendimentos do capital, os impostos regressivos devem ser reforçados, a segurança social financia o lucro, as operações de capital são isentas de operação de registo. Pior ainda, a solução que nos está a ser apresentada para a crise económica é esta: o capital exige uma parte maior do salário directo ( reduzindo o pagamento pelo trabalho) e do salário indirecto ( transferindo para o privado o financiamento da saúde ou educação). A isto se chama recuperação da competitividade “( pág. 16-17).

Mais: “ para haver emprego, o salário deve ser reduzido e a esse mal devemos chamar um bem” ( pág. 26), citando Medina Carreira que ao longo do livro é apresentado, assim como Vítor Bento, Nogueira Leite a que se juntam prémios Nobel, como autênticos artífices intelectuais da guerra de classes em curso, sempre ao lado do capital.

O livrito é um requisitório actual, pós moderno, da crise mais recente do capitalismo agora apodado de neoliberalismo.

Uma das passagens mais interessantes é a citação de um autor moderno – Robert Barro, apresentado como futuro Nobel- para lhe refutar as teorias apresentadas em modo simples, mas com um condimento que se aplica que nem luva branca ao economista catedrático, Louçã:

“Há duas razões essenciais para a complexidade constitucional da economia: a economia descreve processos de relações sociais, em parte indeterminadas e dependentes das escolhas dos agentes; em segundo lugar a economia descreve processos históricos com memória e dependência sensível das condições iniciais. Considerar a economia num contexto completamente determinista é uma forma ingénua de recusar estas características sociais e históricas.”

Para além de refutar toda a teoria económica sem lhe chamar nomes – “burguesa” seria o termo adequado aqui há uns anos, mas que evita por razões óbvias de aggiornamento retórico- Louçã envereda pela solução final para o nosso problema: “ a emergência de uma política socialista.

Ora bem. E começa logo com citação de Hegel. Que escrevia que a “desigualdade social cria a plebe, destituída de tudo, do mínimo de subsistência, de dignidade e até do sentimento do direito, e acima dela uma classe de riqueza desproporcionada.

Cá estamos, na página 159, no ponto nevrálgico do problema de Louçã, o comunista. No pressuposto de que “o Direito é assim excluído da maioria da população”, Louçã propõe-se refazer a “batalha” pela recuperação do Direito para os povos, através de soluções “que contrariem a destruição neoliberal pela economia cruel, procurando recuperar o salário e o rendimento, utilizar os bens comuns e promover a democracia económica.”

Medidas? Várias e todas no mesmo sentido: reverter a tendência, para o comunista Louçã sempre constante, de subalternizar o salário em relação ao capital. "Proletários do mundo inteiro:uni-vos!", agora soa mais a "assalariados de toda a parte, estais lixados!"

Há um pequeno problema nesta equação do comunista Louçã: a defesa da “democracia económica” que “corrija os desequilíbrios e desigualdades” tem que contar com um Estado. Louçã evita falar nesse problema porque não lhe interessa escarrapachar em livro a teoria marxista sobre o Estado e que sem dúvida alguma defende e esconde do leitor desprevenido.

O comunista Louçã nunca conseguirá pôr em prática qualquer uma das medidas que propõe por uma simples razão estrutural: o Estado é burguês. E para o mudar é preciso...uma revoluçãozita. E estas estão pelo preço proibitivo do caos social. E nunca deram bons frutos em lado algum. E foram abandonadas pelos que as experimentaram. Mas tal não demove o comunista Louçã porque ele saberia fazer diferente, mesmo tendo à ilharga os paradoxos que enunciou sobre a complexidade da Economia de que aliás é catedrático professoral.

Marx e Engels ensinavam ( por exemplo na “Origem da Família da propriedade privada e do estado”) e Louçã aprendeu muito bem, mas esconde melhor, que o Estado é um produto da sociedade ou um estado determinado do seu desenvolvimento; é o testemunho de que esta sociedade se envolve numa contradição insolúvel com ela própria, tendo-se cindido em contradições inconciliáveis que não pode resolver. Mas a fim de que os antagonistas, as classes com interesses económicos opostos, não se destruam, a si e à sociedade numa luta estéril, impõe-se a necessidade de um poder que, colocado na aparência acima da sociedade, é chamado a atenuar o conflito, mantendo-se dentro dos limites da “ordem”; e este poder, nascido da sociedade mas que se situa acima dela e se lhe torna cada vez mais estranho, é o Estado” ( citações de uma lição copiografada para o 1º ano de Direito Constitucional- regido por Vital Moreira- na faculdade de Direito de Coimbra, em 1975-76).

Em resumo e fundamentalmente “ o Estado é o produto e a manifestação do facto de as contradições de classes serem inconciliáveis. O Estado aparece precisamente e na medida em que, objectivamente, as contradições de classe são inconciliáveis.”

E a interpretação correctiva de Marx, efectuada pelos intelectuais “burgueses” ou “pequeno-burgueses”, aponta noutro sentido: o papel do Estado seria o de conciliar as classes. O que o comunismo refuta.

E o comunista Louçã, sobre isto o que pensa ou diz? Nada de nada, não vá alguém perceber que parou no séc. XIX na leitura de Marx e Engels, cujos frutos degeneraram naquilo que os países de Leste abandonaram no final dos anos noventa: tretas que amaldiçoaram milhões de pessoas.

Tretas que o comunista Louçã ainda comunga religiosamente, no silêncio sepulcral das suas ideias reprimidas, obrigando-se a um papel de pequeno-burguês encapotado numa “esquerda caviar”.

7 comentários:

Manuel Pereira da Rosa disse...

Há uns tempos atrás vi um cartaz do BE onde se afirmava:«eles roubam e nós pagamos». Pergunta-se, quem são os «eles» e o «nós». Vivem no Castelo mas pensam como se vivessem na floresta. Louçã não e solução para nada. Quanto ao caos social ele está aí, cada vez mais próximo, nesta tirania degenerescente que não augura nada de bom.

zazie disse...

Tem piada como o José lhe apanhou bem os tiques e truques.

Mas ele não fala no Estado? actualizou a "luta de classes" para luta entre assalariados e grande capital e quer democracia socialista sem explicar que Estado seria esse?

josé disse...

Este gajo é um fdp dos grandes.

zazie disse...

Pois é. É manhoso.

Wegie disse...

Eles agora adoram o Estado Social num
Altar. O Marx deve estar a dar voltas na tumba.

Lura do Grilo disse...

Criam uma realidade bem à sua maneira, com eternos conflitos entre os seus bons e os seus maus, para logo depois proporem soluções que redimem essa realidade.

Os resultados dessas soluções já as conhecemos e vamos conhecendo mas estão convencidos que se tentarem outra vez descobrirão entre os escolhos o Homem Novo.

joserui disse...

"Este gajo é um fdp dos grandes."
Direi mesmo mais! Um grande fdp! -- JRF

A obscenidade do jornalismo televisivo